"Ariel" de Lois Patiño amanhã no grande ecrã do TAGV (CAMINHOS DO CINEMA PORTUGUÊS)
16 NOV · DOM · 14:45 · TAGV | FESTIVAL CAMINHOS DO CINEMA PORTUGUÊS
Ariel, Lois Patiño, 105’, PRT/ESP, 2025
Uma atriz chega aos Açores para participar numa encenação de A Tempestade. Estranhos comportamentos na ilha e o encontro com Ariel abrem-lhe a porta para um território suspenso entre o real e o onírico, onde natureza, espírito e teatro se entrelaçam num ritual poético sobre liberdade, presença e fantasmagoria.
A incrível proposta cinematográfica de Lois Patiño desvela-nos um mundo dentro de um mundo. Uma ilha cercada por oceano, um oceano cercado por continentes. Uma espécie de reduto da alma onde todas as frações desta, que por vezes são tão contrárias umas às outras, coexistem juntas numa ilha onde estão aprisionadas, atuando simultaneamente as suas peças. Como metáfora para tudo aquilo que fomos e que já não somos, ou para o que somos e depois não seremos, cada uma das personagens da ilha, interpretadas, ao que parece, por não-atores da própria ilha do Faial, incorpora o lado trágico de cada personagem: o seu esquecimento ou a sua vontade de se libertar da própria personagem - de ser, tal como o ator. Apesar da reflexão de Ariel, a meio filme, de que as personagens não são criadas pelo autor, mas que o autor sim é que é criado pelas personagens, nunca vemos o dito autor, sendo a sua figura mais etérea do que o próprio oceano que banha os Açores. Também a tintagem a roxo do oceano estabelece logo ao início o problema central: A água do mar, tal como as luzes da peça “Shakespeare-Pop”, são roxas. Este Sol que ilumina os dois espaços não é mais que um Sol enganador e Patiño parece querer sugerir que, dada a imensidão do oceano, a representação da vida extende-se até aos matagais do nada, que ela é eterna e omnipresente.
Aqui começam a surgir os problemas - o que acontece se eu quiser deixar de representar? Posso sequer fazê-lo? Criei eu próprio esta personagem que agora me atormenta? Fui levado a criá-la para aderir a um desejo coletivo, para compartilhar uma admiração social? Ou existe um criador? E se é verdade que ele existe, será ele sensato e bom, ou cruel e insensato? Porque nos deixou ele neste navio sem mastros para sofrer?
Para além de todas estas perguntas que são lançadas tanto pelo realizador como pelas personagens da peça/filme, é necessário notar que a escolha de tornar a ilha do Faial num cosmos Shakespeareano, onde todas as peças são representadas, tanto as tragédias como as comédias, é o que dá um sentimento universal a esta história com trejeitos tão locais, pois tanto os décors, como o guarda-roupa e até os atores remetem para um espaço perdido no tempo, quase atemporal, o que é o mesmo que dizer que nesta ilha se vive sempre o mesmo tempo, como é evidenciado por Irene, a Ariel d’A Tempestade de Shakespeare.
A incrível proposta cinematográfica de Lois Patiño desvela-nos um mundo dentro de um mundo. Uma ilha cercada por oceano, um oceano cercado por continentes.